terça-feira, 28 de setembro de 2021

MIL DIAS

Um país religado com seu passado ditatorial militarizado e, paralelamente, mergulhado em um presente mundial especialmente desastroso, do ponto de vista da classe trabalhadora, porque a está sujeitando inteiramente aos imperativos do capital. Eis a realidade do Brasil no milésimo dia do governo Bolsonaro, recentemente completados e resultado, ele mesmo, dessa realidade construída internacionalmente pelo capital em sua fase neoliberal. Como bem disse ontem o Prof. Emir Sader, "os piores mil dias das nossas vidas". Lamentável que tantos, até agora, não tenham consciência do conjunto de fatores que nos trouxeram a este hoje cor de chumbo. No entanto, as chagas sociais provocadas por um tal projeto de mundo estão expostas por todos os lados, em todos os continentes. Talvez  no Palácio do Planalto Central Brasileiro a maior, a doer nas costas de cada pobre do país e a servir de exemplo para o que de pior existe no mundo.  

Globalmente, acentua-se a brutalidade no trabalho dos mineiros e dos industriários para que parcela significativa da humanidade porte um smartfone e possa ser cotidianamente  inoculada com uma forte dose de manipulação ideológica.

No mundo e no Brasil, nos mais diversos setores produtivos e de serviços, é perceptível o avanço da exploração máxima da "mão-de-obra", embora não seja perceptível aos "que vagam cegos pelo continente" a presença humana dentro da mão e da obra.

No mundo e no Brasil, multiplicada assustadoramente e garantida por "leis", espalha-se a precarização do trabalho e da classe trabalhadora. Condições sub-humanas, assédios, salários miseráveis, ataques ferozes ao movimento sindical, repressão policial às resistências localizadas, são retratos da atualidade. 

No mundo e no Brasil,  os espaços de trabalho tornam-se, majoritariamente, focos de insegurança, humilhação, desalento, adoecimento, contaminando inevitavelmente, todas as outras esferas da vida social - familiar, cultural, política.

Esta barbárie da ordem sócio-econômica vigente, os desastres ecológicos por ela produzidos, o inaceitável  abismo entre a imensa riqueza de poucos e a gigantesca pobreza de muitos, a opressão de gênero e de etnia, diuturnamente reforçados, a "guerra híbrida"  em que nos joga permanentemente o "império", estão a exigir um contraponto.

Frente à fragmentação que desagrega, soprada pelo Vento Norte, há que se responder,  ventando do Sul, com a defesa radical da unidade na luta, que não pode ser reduzida a estilhaços dispersos. Só ela será capaz de agregar as forças necessárias à Resistência.

Frente à mercantilização generalizada, que deformou o cidadão, reduzindo-o à condição de consumidor (do planeta?),  e sabendo que as benfeitorias atribuídas ao mercado não compensam seus crimes, há que se responder com a defesa radical de uma economia solidária que partilhe o pão e a renda, buscando o pagamento da dívida que a sociedade tem com as produtoras e produtores da riqueza planetária, aqui partícipes os povos originários.

Frente à possibilidade de que este tempo de horrores seja prolongado por bem mais do que mil dias, tendo em vista a permanência dos propósitos capitalistas, há que se responder com propósitos revolucionários. Podem não estar postas as condições objetivas para que a Revolução Social aconteça hoje. Mas é dever da esquerda estar a postos para intervir em prol da construção de tais condições - só assim, um dia será possível.

Mas quais propósitos podem ser considerados revolucionários neste XXI tão reacionário, tão retrocedido em relação ao pensamento crítico, tão viciado na tirania burguesa fantasiada de institucionalidade, tão contaminado pela desfaçatez personalista?

De pronto, talvez fosse bom propor aos quatro ventos a luta pela superação da democracia liberal burguesa, fazendo avançar a luta pela radicalização da democracia participativa direta em esferas cada vez mais amplas, tornando-a política em todos os espaços coletivos ocupados. Seria um primeiro passo em direção à desconstrução do aparelho burguês de dominação. Orçamento Participativo em tudo, inclusive nas instâncias partidárias. - Tribunas Populares, Conselhos, Consultas Populares, Construção Coletiva de Programas e Compromissos. Daria trabalho. Mas seria Revolucionário. Afinal, assumir uma Direção Estudantil, uma Direção Sindical, uma Prefeitura, um Mandato Parlamentar, um Governo Estadual, o País, para quem quer ser revolucionário um dia, só tem sentido, só se justifica, se for para torná-los espaço de Contraponto à ordem estabelecida pelas classes opressoras.

MARIA