quarta-feira, 8 de novembro de 2023

QUEM É MESMO O TERRORISTA?

 


"Israel acredita que, se confinar e esmagar os palestinos com força e rigor suficientes, eles se extinguirão e os israelenses viverão "felizes para sempre". É o que tem sido feito nos últimos 75 anos, mas, até aqui, não funcionou. Tem produzido, isso sim, um desespero no lado palestino que leva à explosões como a que vimos no último 7 de outubro."
OMAR BADDAR
PALESTINO, ANALISTA POLÍTICO
JACOBIN BR, 18/10/2023


Talvez o  mundo ocidental não se levante pela Palestina. Teve 75 anos para fazê-lo e não o fez. Os olhos deste mundo, até aqui cerrados para as atrocidades cotidianas praticadas pelo Estado de Israel contra o Povo Palestino  há décadas, agora se abrem, mas só enxergam "o terrorismo do HAMAS". E, mesmo as vozes, quase todas, levantadas para "repreender" o governo israelense pelos excessos na resposta, salientam sempre, antecipada e enfaticamente, que "o HAMAS é terrorista". Aí, vão dormir em paz. Algumas, por não conhecerem a história. Outras, mesmo conhecendo.
Todavia, para melhor compreender esta guerra de extermínio empreendida por Israel contra palestinas e palestinos, é imprescindível refletir sobre algumas questões fundamentais. Entre elas, QUANDO COMEÇOU e O QUE É O HAMAS. Apesar desta necessidade,  na maioria dos textos e das falas  contundentes dos "especialistas da grande mídia ocidental", neste trágico final de 2023, elas não têm estado presentes. Talvez deliberadamente.
COMEÇOU em 14 de maio de 1948, com a instalação oficial do Estado de Israel, por resolução da ONU, como parte do Plano de Partilha da Palestina, por ela elaborado logo depois do fim da II Guerra. Tudo sob pressão do EUA e do Movimento Sionista Internacional. Foi assim que o ocidente capitalista cravou seu tacão de ferro no Território dos Palestinos. O objetivo era concluir o que o "protetorado"  britânico, lá imposto ao final da I Guerra, não tinha conseguido terminar: tornar a região uma "sentinela avançada" do capitalismo "do lado de cá" em meio aos árabes, "nunca confiáveis", e "nas barbas" da então UNIÃO SOVIÉTICA, "amiga deles". A justificativa farsesca para aquela decisão foi a compensação histórica devida ao povo judeu por seu holocausto durante o período nazista. Os países árabes do entorno não aceitaram. Entraram em guerra com o novo país naquele mesmo dia. Mas foram derrotados. Os vizinhos  tinham chegado muito bem armados e com padrinhos importantes. Aquela primeira vitória militar israelense permitiu de pronto seu avanço na ocupação de territórios e o primeiro grande massacre palestino.
Assim, o 14 de maio de 1948 está inscrito na memória histórica do povo palestino como o " DIA DA NAKBA". NAKBA é o termo árabe para "CATÁSTROFE". Um dia que não acabou mais a partir de então. Catástrofes que se repetem, se transformam e só pioraram com o passar do tempo. Com guerra ou sem guerra. Cidades destruídas, atividades econômicas impossibilitadas, campos de refugiados espalhados e constantemente atacados, vidas interrompidas, violações todas, privações, as máximas. MAS RESISTÊNCIAS, SEMPRE. Entre elas, a do HAMAS.
HAMAS é a sigla em árabe do MOVIMENTO DE RESISTÊNCIA ISLÂMICO. Para conhecer sua história, o primeiro passo é descolar dele a alcunha pejorativa e islamofóbica de terrorista, que lhe tem sido atribuída pela mentalidade colonialista das potências ocidentais. Só elas podem. Foi criado em 1987, durante a rebelião conhecida como "PRIMEIRA INTIFADA PALESTINA" (despertar em árabe ).
A classificação de "terrorista" torna-o indefensável até mesmo para pessoas e coletivos simpatizantes da causa palestina. No entanto, tal qual democracia, a palavra terrorista é mesmo relativa. No Brasil, por exemplo, o MST é chamado de terrorista por muitos. Os criminosos do 8 de janeiro e da bomba no aeroporto, não. Este condicionamento imposto pela manipulação ideológica do capital internacional traz nas entrelinhas, quando não a defesa da  "solução final" para o povo palestino, uma visão salvacionista de ajuda ocidental aquele povo para que não pereça, mas negando-lhe o direito de lutar por sua própria emancipação.
O HAMAS tem por objetivo a criação de um Estado Palestino Soberano que ocupe legalmente terras da Palestina Histórica. Atua nos campos social, cultural, político institucional e militar. Desde 2006, governa a região de Gaza, tendo sido eleito democraticamente. A Autoridade Palestina, já reconhecida internacionalmente desde que abdicou da luta armada, governa a região da Cisjordânia. Não por acaso a cidade de Gaza, desde 2007, tem sido mantida sitiada pelo exército israelense, alvo de bombardeios sistemáticos, com precários serviços de saúde e educação, sendo considerada, por entidades humanitárias internacionais que a assistem, a maior prisão a céu aberto do mundo contemporâneo. Tudo isso porque o HAMAS tem adotado a postura de não ceder às exigências de Israel, EUA e União Europeia. Os habitantes dos territórios ocupados, cansados de esperar por um acordo de paz que não vem, passaram a considerá-lo o  símbolo atual da RESISTÊNCIA PALESTINA. 
Em 2017, a ANISTIA INTERNACIONAL denunciou Israel por usar regime de apartheid "que domina a população palestina como um todo, praticando políticas de segregação, expropriação e opressão contínuas que caracterizam crimes contra a humanidade." O mundo fingiu não ouvir. Recentemente, o Secretário Geral da ONU, Antônio Guterres, afirmou que o ataque a Israel em 7 de outubro não aconteceu no vácuo, porque o povo palestino vive aterrorizado por Israel há 75 anos. Também fingiram não ouvi-lo, as maiorias.
Frente a uma realidade assim constituída, a pergunta que não pode ser calada é " Será o HAMAS mesmo o terrorista?"  Dependendo da resposta dada pela humanidade, saberemos se ainda é possível recriar o mundo, antes que ele acabe. Ou não.

                                                                                MARIA 


  "Quem cala sobre teu corpo
   Consente..."´
   MILTON  NASCIMENTO