quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

FAZENDO O TEMPO DE ADIANTE



 "OS PASSOS PARA TRÁS NEM SEMPRE SÃO UM RETROCESSO"
 PALAVRAS NO MURO


O andar cada vez menos crítico da esquerda  contemporânea, moderadíssima em sua concepção de luta,   e em grande parte institucionalizada em Partidos, Movimentos Sociais, Mandatos Parlamentares ou Mandatos Executivos, tem trocado a reflexão coletiva, só ela capaz de dar consistência ao caminho, por uma prática política ajustada, acomodada, ao "espírito " do tempo, sempre justificada por urgências e emergências. Esta é uma constatação corrente entre aquelas e aqueles que se negam ao cabresto do pensamento único e continuam refletindo sobre as razões da realidade social deste XXI.
No entanto, para o enfrentamento eficaz dos desafios colocados, não é só a ação direta que precisa ser resgatada, há que resgatar também  a reflexão teórica. Porque só um encontro bem sucedido entre o compromisso ativista de estar e a compreensão intelectual das razões deste estar vai qualificar a inserção das organizações de esquerda  nos diferentes espaços políticos.
O projeto neofascista do inominável governo federal anterior, chegado ao poder por um golpe jurídico-midiático, e derrotado eleitoralmente em 2022,  no que tange ao poder executivo central, permaneceu organizado, forte e vitorioso no parlamento nacional, na maioria dos governos e parlamentos estaduais e municipais. Desafiando, boicotando, e sitiando LULA III o tempo inteiro.
A tentativa, dita fracassada, do 8 de janeiro não foi tão fracassada assim. Seus mentores, financiadores, articuladores e incentivadores, entre eles a cúpula da forças armadas, o agro-pop, os organizadores das milícias digitais, os bacanas da Faria Lima e a própria besta-fera e sua família, continuam soltos e fazendo política. Ingenuidade pura acreditar, e divulgar, que "a justiça tarda mas não falha". Tarda e falha, em toda sociedade dividida em classes. Por isso,  comemorar nossa "democracia inabalada" sem denunciar que  golpes continuam sendo dados ou tentados cotidianamente contra o povo brasileiro , é apenas propagar uma ilusão que acentua a desmobilização popular e o analfabetismo político.. Porque, embora bastante significativos,  não basta a restauração dos símbolos arquitetônicos dos "três poderes" e, nem mesmo a continuidade do funcionamento oficial de cada um, para que se possa considerar "inabalada" nossa democracia.
A continuação abusada da violência contra os povos indígenas e os camponeses do MST, a resistência do garimpo ilegal em abandonar territórios por ele ocupados, o prosseguimento do genocídio policial nas periferias urbanas, a destruição dos serviços públicos nos Estados e Municípios, entre tantos outros ataques, não abalam a democracia.? Eles serão intensificados em 2024, que não se duvide disso. Mas não serão a pedra maior colocada nesta trilha. A montanha a vencer está dentro de nós. Para que se possa ir além .
Resgatada de si mesma, a esquerda poderá deixar de ir às ruas apenas para ganhar eleições e "administrar melhor o capitalismo". Voltará às praças e aos becos  para subverter a ordem do capital, hoje vitoriosa globalmente. Uma vez que é seu compromisso/semente  contribuir para o avanço da consciência de classe dos precarizados  do mundo. Compromisso que exige um "cuidado" com as vozes levantadas. Fortalecê-las no debate coletivo é condição para que não se percam nem se contaminem em meio ao vozerio neoliberal predominante. Porque é com a bagagem que trazem dentro que lutadoras e lutadores sociais vivem seu hoje histórico  e deixam montado um cenário para o  tempo futuro.
O tempo de agora fazendo o tempo de adiante. 



                                                                                         MARIA



 

quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

OS LANCEIROS NEGROS

 

"SABER É O PRIMEIRO PASSO EM DIREÇÃO AO COMBATE"
                                     PALAVRAS NA CERCA   


LULA sancionou, no último dia 5 de janeiro, a LEI 14.795/24, proposta pelo Senador Paulo Paim, que inscreve "os lanceiros negros do RS" no "Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria", como parte de uma reparação  histórica bem mais abrangente do que uma simples homenagem àqueles soldados que lutavam bravamente por sua própria liberdade, traídos e assassinados pelo conluio entre o império do Brasil e a classe dominante sul-rio-grandense, lá nos idos de 1845. Vai além, porque também traz, nas entrelinhas, o reconhecimento oficial do Estado do Brasil à contribuição basilar de negras e negros na construção da sociedade brasileira. E ainda chama a atenção para o racismo estrutural que nublou por muito tempo a produção historiográfica do RS. E, eventualmente , permanece por aí.
Na maior parte das vezes, a grande rebelião de 1835 foi, e continua sendo, chamada de Revolução Farroupilha. Mas Revolução não foi. Porque Revolução é um Movimento que tem por objetivo subverter a ordem sócio-econômica estabelecida. E os latifundiários do Rio Grande do Sul não queriam subverter a "ordem" instalada nestas plagas. Não queriam dividir a terra, não queriam o final da escravidão, nem devolver o gado chimarrão aos guaranis, nem abrir mão de quaisquer privilégios de classe. Só queriam garantir direitos que consideravam "seus" e não estavam sendo respeitados pelo poder imperial.
O mais comum dos tropeços historiográficos cometidos por aqui é, sem dúvida, a não inserção da "guerra dos farrapos" no processo mais amplo que foi a chegada do liberalismo ao Brasil, no alvorecer do XIX. O que leva, consequentemente, ao "esquecimento" de que, naquele mesmo período, explodiram rebeliões semelhantes  no  país inteiro, todas fruto da insatisfação das camadas economicamente dominantes nas províncias brasileiras. Uma defesa intransigente do Federalismo pelo inconformismo geral dos "proprietários" com o protecionismo dado ao cafeeiros do Sudeste pelo governo central. Seguindo os ventos soprados, já na época, pelo grande "irmão" do Norte.  Foram todas vencidas pelo Império. Faltou-lhes gente para o combate. Porque não ousaram colocar armas nas mãos dos contingentes escravizados. Podiam ser viradas contra eles. Preferiram acordos costurados nos gabinetes aos riscos de uma revolução social. Na chamada  República de Piratini parecia diferente. Os trabalhadores escravizados foram chamados à luta, a "palavra de honra" dos caudilhos sulistas assegurava liberdade no fim do caminho, para quem sobrevivesse. Na hora final, no entanto, bem sabemos de Porongos.
A manipulação da história é instrumento de dominação  bem conhecido e tem sido utilizada desde os primórdios da sociedade dividida em classes. Fazer o contraponto, divulgando  a história real - porque devem ser chamados de heróis os negros entregues por  Canabarro à sanha de Caxias ou porque o 20 de novembro deve mesmo ser  feriado nacional , por exemplo, - é compromisso de todas, todes e todos que lutam por uma sociedade justa. COMUNISTA.
                                                                                             
                                                                                   MARIA