domingo, 31 de maio de 2020

PARA UM OUTRO MUNDO, UM OUTRO CURRÍCULO

POR QUE NÃO?

1) Por que não, trocar boa parte da gramática pelo desafio de ensinar a ler nas entrelinhas?
2) Por que não, contar a história da guerra do Paraguai pelo ponto de vista paraguaio?
3) Por que não, trabalhar os corpos como festa na biologia e na educação física ou na química e na educação artística?
4) Por que não, considerar o corpo humano como guardião do respeito pela vida planetária nas humanas e nas exatas?
5) Por que não, ensinar matemática destacando que a operação mais importante é a divisão equitativa da riqueza?
6) Por que não, mostrar a invisibilidade dos " involuntários" da pátria nas aulas de literatura, história e geografia?
7) Por que não, buscar a coerência entre o que se diz e o que se faz, em todos os momentos?
8) Por que não, admitir que uma prova não prova nada seja qual for o componente curricular?
9) Por que não, reconhecer que o conceito de meritocracia, em qualquer nível de ensino, é uma fraude numa sociedade perpassada pela iniquidade?
10) Por que não, utilizar o fio curricular para tecer um mapa-múndi pintado com as cores do arco-íris?
11) Por que não, tornar o espaço escolar  um centro produtor de vacinas contra o personalismo e a perversidade, a indiferença e o moralismo hipócrita, o capital e a barbárie? 
12) Por que não, compreender que na construção do conhecimento a pertinência da pergunta feita é mais importante do que qualquer resposta?
13) Por que não, uma prática curricular que possa contribuir para superar a "normalidade" que nos trouxe a 2020?
                                                                                  MARIA

terça-feira, 26 de maio de 2020

POR QUE 2020?

Talvez o Brasil esteja hoje protagonizando o apogeu de um processo político golpista que começou a ser colocado em prática com o impedimento fraudulento da Presidenta Dilma Rousseff, avançou com a também fraudulenta condenação do ex-Presidente Lula e consolidou-se com a farsa eleitoral de 2018. Tudo isso alimentado pela disseminação do ódio e da intolerância com o que não é espelho, que inviabiliza qualquer debate racional sobre a realidade, sequestrando o pensamento crítico. Impossível não relacionar a situação contemporânea  com a história vivida lá atrás, nos idos da década de 1960.
Em 1964, foi deposto, por um complô civil-militar, o Presidente João Goulart, legitimamente eleito e com seus poderes presidencialistas confirmados pelo voto de 95% dos eleitores, através do Plebiscito  realizado um ano antes. Portanto, um flagrante e inegável ato de desrespeito à vontade popular. Mas também  uma flagrante e inegável subserviência da elite econômica nativa aos interesses do capital internacional, liderado pelos EUA.
Tal como no impedimento de Dilma Rousseff, eleita em 2010 e reeleita em 2014, com 54 milhões de votos. De novo, um flagrante e inegável ato de desrespeito à vontade do povo expressa nas urnas.E, de novo também, flagrante e inegável ato de subserviência ao Império, praticado pela classe rica.
Logo em seguida, naquele tempo, foram perseguidas, desmoralizadas publicamente e cassadas as lideranças que podiam fazer o contraponto. Entre elas, o ex-Presidente JK, que poderia ter apoio popular para uma recandidatura à Presidência da República - acusado e condenado por atos de corrupção que nunca foram juridicamente comprovados. 
Tal como agora repetiu-se com Lula, que poderia ter sido reeleito há dois anos. E tem acontecido com inúmeras outras lideranças do MST e do MTST. Além  da impunidade garantida aos mandantes dos assassinatos de Marielle e Anderson, da juventude negra, dos pobres da periferia, das mulheres guerreiras, do índios...
A base ideológica que garantiu o sucesso inicial daquele golpe era propagandeada pelas rádios, pela televisão que iniciava, pelos jornais e revistas, pelas falas do púlpito - as redes da época.Falava do perigo comunista, da degradação dos costumes, dos ataques à "sacrossanta" família, da "liberalidade" de alguns professores. Inimigos  da Pátria todos eles, que não colocavam Deus acima de tudo. 
Tal como no presente repete-se aos olhos de todos o discurso de ódio, pregando a morte do diferente e potencializando-se pela explosão dos meios informatizados de comunicação. Os argumentos continuam os mesmos.
A primeira eleição presidencial organizada pelos "salvadores" de então fantasiou-se de democracia para que um "colégio eleitoral", "eleito" pelo povo, indicasse o novo Presidente da República - um homem das fileiras do Exército, já escolhido previamente pela cúpula militar que estava no comando,  de acordo com os interesses do capital internacional e com a subserviência da colonialista, patriarcal e escravocrata sociedade brasileira. Mas, principalmente, formada por "cidadãos de bem".
Tal como em 2018 onde a primeira eleição presidencial após "O 16" teve ainda mais ares democráticos. Afinal, a fantasia vestida chamou-se "as instituições estão funcionando". Mal, funcionando mal, como todos sabiam mas não diziam. E os "cidadãos de bem", saudosos de um tempo de trevas, outra vez entregaram a "mãe gentil tão distraída" à sanha do deus-mercado. Elegeram um sujeito/morte com um imenso potencial para destruir, porque era o que tinham E não vacilaram. Alguns já se arrependeram. Outros, só fingem que não sabiam. 
Acontece que depois de 64, veio 65, 66 e 67. Alguns olhos foram se abrindo e vendo o arbítrio. A resistência cresceu. Então, precisou 68, o ano que só terminaria muitos anos depois. Essa história todos sabem.
Será 2020 o 68 que nos cabe no momento? 
Para onde um ano assim,tão marcado historicamente, levará os brasileiros, a humanidade e o próprio planeta, ainda não sabemos. O que não podemos esquecer é que, nele, além do verme, temos o vírus. E, como disse Gramsci, só a luta pode ser prevista.
Quem sabe, o primeiro passo  para seguir adiante seja um olhar reverso sobre as estradas que nos trouxeram a 2020, tentando compreender porque chegamos a ele. Para, quem sabe, fazer diferente no adiante, abrindo outros caminhos.


                                                                                             MARIA





  



sexta-feira, 22 de maio de 2020

UM ALÔ PRA JUVENTUDE DE TODAS AS IDADES

Meus queridos, queridas e querides

Escrevo porque tenho saudades. Dos abraços e dos beijos. Dos olhos nos olhos. Do calor dos corpos. Das vozes no vento. Da balbúrdia a cada encontro.
Daqui do meu canto, ao som do mar que o vento me sopra,continuo pregando a rebeldia. E que rebeldia é esta exigida pelos tempos?
Ora, bem sei que o distanciamento físico é, no momento, a condição primeira para que se possa voltar um dia desses à festa cotidiana que a vida pode e deve ser, apesar dos pesares. Então, respeitá-lo é hoje a expressão maior de rebeldia. Que não nos falte rebeldia, pois. Contra o capital. Que nos quer aglomerados e indiferentes às filas dos sem-renda, ao medo dos sem-teto, ao desamparo dos índios, à insegurança dos que estão trabalhando nas ruas. Que nos quer submissos ao "espírito da época" - personalista, exibicionista, consumista e oportunista.
Todavia, mesmo isolados, podemos, devemos e queremos continuar falando, cantando, dizendo poesias, aprendendo e ensinando. Pelas "redes". Pois é.
Essas "redes" que tantas vezes vocês tentaram me convencer a usar e nunca conseguiram. Nessas "redes" em que continuo enxergando profundas insuficiências e graves distorções da realidade. Mas em que estou aprendendo a transitar. Porque é preciso. E, quando é preciso, se faz.
Agora tenho whats, participo de lives, o "Andarilho" está no facebook. O até aqui inimaginável invadiu minha realidade. 
Daqui do sul do mundo, mesmo sem poder mergulhar os pés nas águas geladas do  Atlântico ( a praia está interditada em nome da vida), continuo espalhando panfletos nesse oceano virtual, como se fossem mensagens em garrafas lançadas ao mar. Alguém pode encontrar, quiçá lhe sejam úteis. Assim, terei feito das palavras da  professora um instrumento de luta por um mundo melhor e mais feliz.
Mandem notícias. Visitem o "mariabonitadosul.blogspot.com". Contem dos medos e dos sonhos. Escrevam versos. Desenhem a hora. Chorem pelos que estão morrendo. Pensem nos que estão nascendo. Sejam valentes. Não vendam a consciência. Não se transformem "neles".
E, sobretudo, busquem dentro do peito os instantes mais belos que viveram e não precisaram de fotos ou de vídeos para ficarem na memória. São os mais valiosos e os que mais dão força para seguir adiante.
                          Beijos, Maria
                          AMOR LIVRE SEMPRE!

EM TEMPO: Livrinho imperdível - "IDÉIAS PARA ADIAR O FIM DO MUNDO", 2019, Ailton Krenak, um índio brasileiro, um mestre que vale a pena seguir.
            

terça-feira, 19 de maio de 2020

O QUE PODEMOS APRENDER COM A PANDEMIA DO CORONAVÌRUS?

Boaventura de Sousa Santos, o velho mestre português que continua nos brindando com aulas magistrais, mesmo no calor da hora, já apresenta valiosa reflexão sobre este angustiante momento histórico vivido pela humanidade. Em sintéticas 32 páginas, com o título de "A DOLOROSA PEDAGOGIA DO VÍRUS", registra as origens e os fatores propulsores da tragédia, apontando também os desafios e os compromissos atuais daqueles que desejam um mundo partilhado com justiça. 
Lendo-o, conclui-se que, frente ao "por-vir" incerto, o imprescindível contraponto só pode ser a luta por um "de-vir" possível, onde a exclusão e a negação do outro sejam substituídas pela simbiose e pela aliança entre todos os seres vivos. Ele nos faz perceber que, acima dos territórios e dos ambientes, pairam gestos e posturas. De um "abrir asas" para reverter a queda ou de um "fazer peso" para acelerar o fim.
Destaca, primeiramente, que a atual pandemia não é mais uma crise abatendo-se sobre a população mundial. Ela é, isto sim, parte/consequência (talvez o ápice) de uma crise em andamento, que devasta a humanidade há, pelo menos, quatro décadas. Não pode ser encarada como um estado de exceção dentro da "normalidade" contemporânea porque desde os anos 1980 surgem cotidianamente indícios gritantes de que o mundo está em crise. Indícios estes unanimemente reconhecidos e denunciados no seio de todos os matizes ideológicos, embora as divergências sejam muitas quanto aos fatores que a provocam e aos modos de enfrentá-la. Coincidentemente, este tem sido um tempo em que o neoliberalismo instalou-se como a visão dominante do capitalismo dito "pós-moderno", sujeitando a estrutura econômica cada vez mais à lógica do setor financeiro em detrimento do setor produtivo.
Levando em conta que a palavra CRISE pode ser definida como SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE DEVE SER SUPERADA, chama a atenção para a enorme contradição em que estamos "normalmente" mergulhados - o planeta inteiro numa "situação passageira" que não passa. Há quarenta anos.Tornando-se permanente, a crise pode ser apontada como a causa de tudo. Justifica tudo. Autoriza os retrocessos sociais,trabalhistas, humanitários, que vão cobrindo aceleradamente todos os continentes. Respalda ataques intensos ao ambiente natural. Desfigura até mesmo a esquerda política. Corrompe sentidos e significados. Impede questionamentos e consegue esconder seu maior segredo - a necessidade que tem da própria permanência. Para que o planeta e a humanidade continuem sendo brutalmente degradados em benefício da riqueza de poucos , muito poucos. Embora às custas de catástrofes ambientais e sanitárias até aqui inimagináveis.
Assim, a pandemia vem tão somente tornar mais"normal" a "normalidade" da crise, acentuando sua perversidade. Nisto está sua peculiaridade - piorar o que já estava ruim, agravar o que já era grave. Atingindo "normalmente" os grupos mais vulneráveis de "sempre" - os círculos sociais mais explorados e/ou discriminados, que carregam dores invisíveis  nos tempos "normais" - as mulheres as negras e negros, os trabalhadores informais (ditos autônomos), os sem-teto, os grupos indígenas, as populações urbanas periféricas, os portadores de necessidades especiais, as velhas e velhos, entre tantos outros.
Deixará lições amargas e Boaventura antecipa várias, salientando uma: O vírus não vai, por si só, transformar a realidade social. O racismo, o machismo, a homofobia, o fanatismo religioso, bem como a ganância capitalista pelo lucro máximo, vão permanecer.Além disso, a pobreza e a extrema pobreza vão aumentar.
Leitura imperdível para quem sabe da radicalidade da luta. Porque a pandemia um dia passa, mas o Brasil que emergirá dela será um país estilhaçado, com uma ordem burguesa em conflito interno, onde o irracionalismo e o obscurantismo estarão livres para continuar matando. Um lugar em que será, mais do que nunca ,necessário insurgir-se...
-para subverter a ordem,
-para distribuir a renda,
-para reinventar a vida.
                                             MARIA

sexta-feira, 15 de maio de 2020

O FIM DO MUNDO OU O FIM DE UM MUNDO?

Não sabemos para onde vamos. Mais do que nunca a imprevisibilidade se faz presente em nossos dias. Certezas "absolutas" são derrubadas a cada hora. Otimistas e pessimistas são desmentidos a cada dia pela realidade. "Tudo que parecia sólido desmanchou no ar", fazendo a humanidade vivenciar, por via extremamente dolorosa, a concretização de uma possibilidade já levantada por Marx e Engels no seu Manifesto de 1848.
Confinados que estávamos no perverso sociometabolismo do capital, nos estreitávamos num tempo presente reduzido ao instante, sem prestar atenção nem ao passado nem ao futuro. Vivíamos de migalhas ou de destroços, sem perceber. Nos contentávamos com o desejo de ter, com prazeres miúdos, com pequenas virtudes. Era o possível, afirmávamos. Talvez para aplacar a consciência.
Deslumbrados que estávamos com o crescimento exponencial da tecnologia científica, com o desenvolvimento da informática e da automação, com as imagens fulgurantes da sociedade do espetáculo, nos embrenhamos em um modo de vida onde valores minimamente humanitários foram trocados por um padrão existencial em que as pessoas só se sentem realizadas quando adquirem bens materiais ou conseguem  ocupar espaços de poder, por ínfimos que sejam. O personalismo se sobrepôs ao respeito pelo coletivo. A aptidão para competir ganhou mais importância do que a disposição de partilhar.
Sem provas, mas inflados de convicções, "marchávamos cegos pelo continente", "como se não houvesse amanhã", ignorando todos os "gritos de alerta". Nossos passos na direção errada pareciam passos certos. Ou inevitáveis. Até tropeçarmos no invisível.
Já confinados no tempo, precisamos, além disso, ficar  confinados no espaço. Para não morrer.
Abriremos os olhos? Ou continuaremos nessa  corrida  vertiginosa em direção do abismo?

EM TEMPO:Para as milhares, quiça milhões, de vítimas fatais da COVID 19, 2020 está sendo o ano do fim do mundo.

                                                                  MARIA