terça-feira, 26 de agosto de 2025

PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE FLORES

 


Vem, vamos embora,
que esperar não é saber.
Quem sabe faz a hora, 
não espera acontecer
            Geraldo Vandré



O Partido dos Trabalhadores está "sob nova direção", eleita em 6 de julho, com a participação de cerca de 25% de seus filiados no dia da votação. Só.
De um "novo" ou "nova" qualquer, o que se espera é, no mínimo, um passo adiante na caminhada. No caso em questão, o PT, imprescindível é que seja um passo à esquerda. Para garantir a luta. Para resgatar a esperança. Porque o tempo é de guerra. Mais uma guerra imperialista. Quem finge não ver ou acredita que é possível ir levando a vida no ritmo de sempre, olhando apenas para o próprio umbigo, não compreende o que está ocorrendo.
Guerra quente e guerra fria. Guerras híbridas.
Palestina, Venezuela, República do Congo, Cuba, Sudão, Irã, Ucrânia, são os cenários mais visíveis da guerra "quente". Da guerra "fria", o palco central é, hoje, o Brasil, mas todo o mundo pobre pode nela ser encontrado.
O PED, no entanto, não expressou uma intenção de mudança no espaço petista para melhor posicionar-se no campo de batalha.. As mesmas correntes de pensamento, já hegemônicas no Partido faz tempo, foram as vitoriosas outra vez. A tendência é que continue a política até aqui praticada. As decisões cada vez mais centralizadas, os diretórios cada vez mais "de informes", a formação política cada vez mais superficial, as ações diretas cada vez mais escassas, a democracia interna cada vez mais desrespeitada, as campanhas eleitorais cada vez mais dentro da lógica capitalista, a questão financeira cada vez mais envolvida em véus. E os resultados cada vez mais pífios, do ponto de vista da classe trabalhadora.
Um Partido que nasceu na esquerda, como instrumento da luta entre as classes, ao administrar o capitalismo foi se tornando um partido de centro, digno representante da política tradicional burguesa, acomodado ao fundo partidário, ao fundo eleitoral, às emendas parlamentares individuais. O interesse de alguns sobrepondo-se ao interesse coletivo.
Dura realidade. Mas ainda há quem queira transformá-la. E, como dizia Paulo Freire, o grande mestre do século XX, a realidade só é até que a gente faça alguma coisa.
Nosso objetivo não pode continuar sendo "melhorar" o capitalismo. Precisa ser mais ousado e ir além, em busca de um futuro socialista.
Urge um Manifesto que denuncie, intensa e profundamente, a contradição existente entre o capital e a vida. Para que se possa anunciar em 2026 um projeto LULA IV radicalmente democrático, propulsor  de mudanças estruturais, humanistas e anticapitalistas.
Urge também pernas na rua, bandeiras ao vento, vontades de fazer diferente, imagens de futuro, além de estudo e muito compromisso.
Qual a disposição do Partido dos Trabalhadores para liderar um processo assim?
No momento,  muito pouca. Ou, talvez, nenhuma.



                                                                                                    MARIA


segunda-feira, 18 de agosto de 2025

CINEMA DE CALÇADA

 



O texto que segue foi escrito no final de agosto de 2008. Celebrava a inauguração do Cine Dunas Cidade. Foi fruto de um  gostar profundo, só traduzido na íntegra pela palavra amigo. Mas foi também fruto da intenção objetiva de registrar o significado histórico dos "cinemas de calçada" na construção da sociabilidade urbana.
Hoje, com as portas já fechadas pelo tempo e as luzes apagadas pela pandemia, o Cine Dunas permanece na memória da cidade como o ponto de encontro  e resistência que sempre foi. Fazendo sua própria história, foi tecendo junto  parcela significativa da história do Rio Grande. 
Neste agosto de 25, veio parar no "mariabonita"  como testemunho de um tempo vivido.



                                                                    "O amor é simples. E as coisas simples, as devora o tempo", escreveu um poeta faz tempo. " Nem sempre", escreveu um outro.





                                                               CINEMA  DE CALÇADA


Rio Grande teve inaugurada, em 25 de agosto passado, uma nova sala de cinema - o Cine Dunas Cidade. Com isso, resgata-se entre nós a tradição cultural dos cinemas de calçada.
Do Cine Teatro Carlos Gomes que, no início da década de 60 do século XX, já estava com as cadeiras sem estofo, mas, nas lotadas "matinées" de domingo, ainda recebia a gurizada que lá ia namorar e ver filmes de "mocinho", alguns torcendo pelos índios. A máquina sempre falhava, acendendo as luzes de repente e deixando ver outros tantos "filmes" espalhados  pela sala. Foi nele, nessa mesma  época, que as estudantes do Curso Normal do Juvenal Miller, que faziam teatro, puderam assistir "Navalha na Carne", com Plínio Marcos. Depois, a professora justificou-se afirmando não saber que a peça era tão "forte".
Do Sete de Setembro, que era o cinema da segunda-feira. Requintado, estofado verde, filmes "cult". Nele, além do filme, imperdíveis eram as notícias do Canal 100 exibidas no início de cada sessão. Era nele que se viam as jogadas e os maravilhosos gols  feitos pelo Garrincha uma semana antes. Na saída, um docinho no "Sol de Ouro".
Do Glória, majestoso pela amplidão, que atraia e acolhia multidões. Para a sessão de domingo, era preciso chegar cedo ou não se encontraria desocupado nenhum dos seus dois mil lugares. Entrava-se, "guardava-se" um lugar e se ia passear em seus corredores-avenida. Via-se a turma da esquerda, a turma da Luís Loréa, a turma do fundão...Quem chegasse cedo, recebia também "O Peixeiro", um jornalzinho com folhas cor-de-rosa e versos de J.G. de Araújo Jorge.
Sabemos que as lembranças, como os cheiros, chegam vindas não se sabe de onde e que por elas o passado se faz presente. Mas o jovem Cine Dunas resgata mais do que os rastros deixados pela história. Resgata espaço de trabalho. Em sua equipe de profissionais encontram-se Cleber e Simão, que um dia atuaram no antigo Cine Glória. Hoje podem ensinar o que aprenderam, um elo foi estabelecido. O filme recomeça, iluminando o conhecimento construído na experiência.
Em tempos de "império da telinha", em que o medo ou o cansaço deixa os humanos incomunicáveis na dita era da comunicação, o cinema pode ser, além de entretenimento e cultura, um ponto de encontro. Por isso, é preciso dizer às crianças e aos jovens desta geração "telinha" que, de vez em quando, faz falta uma "telona". Para que se olhe grande, para que se olhe mais. Para que se olhe junto.
E, olhando junto com todas e todos que já foram conhecer o Cine Dunas Cidade, bom também é perceber que a ousadia não morreu. Ainda há quem ouse. Porque é de ousadia que se trata quando se fala em abrir cinemas neste alvorecer do XXI.
Cleyton e Janete ousaram ao abrir o Cine Dunas Cassino. Agora ousaram mais ao presentear também a cidade com a belíssima sala da Rua Andradas, de onde até se pode ver, das sacadas, os "fundos do Cine Sete".
É uma ousadia que merece o respeito e o prestígio de todas e todos que acreditam ser um Ponto de Encontro algo a ser respeitado e prestigiado.
Numa terra de muitos ventos trazendo e levando areias, que os braços dos rio-grandinos sejam fortes o bastante para reter estas Dunas no Cassino e na Cidade.


                                                                                                       MARIA