segunda-feira, 31 de março de 2025

CHORAM MARIAS E CLARICES

 


"NINGUÉM PODE DIZER QUE OS NOSSOS COMANDOS ESTÃO FORMADOS PARA A VIOLÊNCIA, MAS SE OS ADVERSÁRIOS DESEJAREM A LUTA, RESPONDEREMOS COM LUTA."
LEONEL DE MOURA BRIZOLA
DEPUTADO FEDERAL PELO RS
DEZEMBRO DE 1963



Em 1 de abril de 1964 chegava ao fim o governo de 30 meses do Presidente João Goulart, sendo  apenas a metade deles sob regime presidencialista. Tinha abraçado o projeto de reformas políticas e sociais mais popular e democrático da história da república brasileira. Um plano de governo até hoje não suplantado em consistência e abrangência, mas que ficou só plano.
Aconteceu aquele governo, numa encruzilhada histórica, no auge da "guerra fria", que dividia o mundo entre os subservientes aos interesses imperialistas do EUA, esperando uma beira, e os que lutavam para manter vivo internacionalmente o princípio de soberania nacional, esperando respeito. Naquele momento, o Brasil podia pender para um lado ou para o outro e a América Latina era um território em disputa. Como hoje. Como sempre, desde 1492.
A Revolução Cubana em 1959, a derrota norte-americana na tentativa de invasão da Ilha em 1961, os mísseis soviéticos lá instalados em 1962, o voto contrário do Brasil à sua expulsão da OEA em 1962, a expropriação da Companhia de Energia Elétrica Rio-Grandense, subsidiária da norte-americana AMFORP em 1959, por Leonel Brizola, então governador do RS e a encampação da Companhia Telefônica Rio-Grandense, subsidiária da também norte-americana ITT em 1962 pelo mesmo governador e a audaciosa "Campanha da Legalidade" em 1961, que garantiu a posse de Goulart após a renúncia de Jânio Quadros, eram sinais de alerta que não podiam e não foram ignorados pelo "grande irmão" do Norte. Porque, além deles, espalhava-se no ar, trazido pelo vento Sul, o brado da classe trabalhadora brasileira do campo e da cidade em luta para "mudar as coisas". Coisa de comunistas.
Nacionalista e "trabalhista", o governo Goulart tentou pender para o lado da luta por soberania. Levantou bem alto a bandeira das reformas reivindicadas pelo Movimento Popular Organizado e pelos Partidos Políticos de Esquerda - reforma da Constituição, reforma Agrária, reforma Universitária, com Plebiscito para referendá-las. Além disso, criou o décimo terceiro salário e a aposentadoria dos trabalhadores rurais. E pior. Sancionou a regulamentação da lei que estabelecia controle e limite à remessa de lucros para o exterior, enfurecendo banqueiros, latifundiários, grandes empresários e multinacionais.
Acontece que, naquele cenário mundial explosivo, o Brasil era pedra fundamental no dominó da política dos EUA. Porque, para o lado que pendesse, poderia levar junto outros importantes países latino-americanos. O projeto populista/reformista nele em curso precisava ser interrompido para não pender na direção "errada". E foi. Com a cumplicidade da escória dominante no país.
Aliança perfeita entre os interesses do capital nacional e os interesses do capital norte-americano. Já parceiros, desde o final da II guerra. 
Juntos tinham criado, em 1949, a Escola Superior de Guerra do Brasil, nos moldes do Colégio Nacional de Guerra dos EUA, e nela, os de "lá" ensinaram aos de "cá" o papel a ser desempenhado pelas forças "armadas" nacionais na guerra "fria" contra a URSS, tendo por base a Lei de Segurança Nacional, "lá" elaborada, "cá" copiada e adaptada. Que mandava prestar atenção no inimigo "interno". Juntos estiveram, ao longo da década de 1950, em várias tentativas golpistas para chegar ao poder, tendo em vista que pela urna não estavam conseguindo, repetindo a unidade em 1961. Perseguindo o mesmo objetivo,  juntaram-se de novo em 1964 para golpear o nacionalismo trabalhista em voga por aqui. 
A justificativa pública para o arbítrio era a restauração da "verdadeira" democracia, maculada pelo governo "comunista" e "ilegal" de João Goulart. Chegava ao povo pelas ondas do rádio, pelas manchetes dos grande e pequenos jornais, pelas páginas das revistas semanais e, até mesmo, pela voz vinda de alguns púlpitos da igreja católica.
Os golpistas de então, fardados ou engravatados, seduziram significativas parcelas  de todas as camadas sociais apresentando-se como salvadores e protetores da pátria, promotores do desenvolvimento econômico e respeitadores das tradições herdadas do passado. 
Paralelamente, calaram todas as vozes opositoras levantadas. Reprimiram, censuraram, perseguiram, desempregaram, prenderam, torturaram e/ou mataram todos os "subversivos" e "subversivas" que conseguiram encontrar.
Foram 21 anos de um tempo cor de chumbo cujas sombras ainda são percebidas no tempo presente. A classe trabalhadora brasileira e latino-americana continua sendo golpeada pela ofensiva político/ideológica do capitalismo, em especial o norte-americano, que não cansa de usar seu poder econômico, corrupto e corruptor, para continuar mantendo sua hegemonia no continente. Como sempre, com a cumplicidade submissa dos capitalistas nacionais.
Atualmente, em nome de um "ajuste fiscal", agora apelidado "arcabouço", que a maioria dos "ajustados" ou "arcabouçados" nem ao menos sabe o que é, só sabe que sufoca, tem sido mantido um severo arrocho econômico sobre as classes laboriosas enquanto seguem firmes as benesses das classes ricas.
Mesmo com um governo que se quer popular e democrático, a realidade não muda. A vida vai ficando cada vez mais precarizada. Falta saúde, educação, saneamento básico, moradia digna, transporte coletivo, salário justo, segurança, esperança. De tais governos, acuados pelo neoliberalismo imperante no mundo, só chegam políticas sociais compensatórias, capazes apenas de mitigar o momentâneo.
Com os Partidos de Esquerda extremamente fragilizados pela institucionalidade, só os Movimentos Sociais poderão interromper a ditadura neoliberal que espalha-se anonimamente pelo planeta inteiro. Resta saber se vão conseguir passar da inércia reinante ao protesto consciente e do protesto consciente à propostas que ultrapassem o imediatismo da urgência sem, contudo, deixar esta urgência de lado.
Então a luta será todo dia outra vez.
De todas e todos.
Por todos e todas.

                                                                  MARIA


" Se você vier me perguntar por onde andei
   Eu te direi amigo
  Tenho 25 anos 
  De sonho e de sangue
 E de América do Sul"
  A PALO SECO
   BELCHIOR

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