sábado, 9 de março de 2013

A DESPOLITIZAÇÃO DA POLÍTICA

Uma tarde na Câmara de Vereadores


A Câmara de Vereadores do Rio Grande tem séculos de História. É a mais antiga do Estado. 
Durante os períodos Colonial e Imperial, administrava a Municipalidade. Seu presidente exercia a função executiva de governo, sendo então inexistente o cargo de prefeito. Os demais integrantes tinham atribuições fiscais (controle dos impostos), administrativas (seleção de funcionários públicos e fiscalização das condições urbanas), normativas (elaboração do Código de Posturas da Cidade) e judiciais (encaminhamento de prisioneiros).
Com a República, transformou-se em Conselho Municipal, passando a ter funções exclusivamente orçamentárias. Surgiu, na época, o cargo de Intendente Municipal que, mais tarde, receberia a denominação de Prefeito. Com a Constituição de 1934, foram restabelecidas a denominação de Câmara Municipal e a diversificação de atribuições. A partir daí, nos longos períodos autoritários como nos curtos períodos democráticos do BR - século XX, foi ela refletindo, como espelho, o tempo histórico vivido pelo povo brasileiro e rio-grandino.
Com a Constituição de 1988, consolidou-se como Parlamento -- o lugar da fala... política. O lugar da fala dos diferentes segmentos sociais, das diferentes correntes de pensamento, que disputavam espaço na cena política local. De novo como espelho, refletia as conquistas resultantes das lutas pela democratização do país. Nela debatiam, e combatiam, quadros políticos de diferentes orientações ideológicas, que se agigantavam na defesa de suas bandeiras partidárias. Sabiam que tais símbolos correspondiam a uma determinada visão de mundo. 
Neste início do XXI, é assustador o que se observa lá. Em cada sessão, um desfile interminável de discursos personalistas, de indicações e sugestões óbvias e pífias, de projetos de lei contrários aos interesses das classes trabalhadoras,  de defesa sórdida  do toma-lá-dá-cá, de vaidades em disputa, de exacerbação do individual em detrimento do coletivo. O eu reina quase absoluto. Mesmo quando temas pertinentes e urgentes são debatidos (como mobilidade urbana, saneamento básico, moradia, e distribuição de recursos para saúde e educação ...) o que prevalece é a demagogia pura.
Entretanto, nossa Câmara de Vereadores não está sozinha em seu mergulho no discurso despolitizado, mas politiqueiro. Há outras muito semelhantes, espalhadas por todo o país. Espelham agora um tempo em que o velho individualismo retorna com força, mas continua mostrando apenas máscaras dispersas. E, como disseram Marx e Engels, na Introdução da sua "Ideologia Alemã", é preciso desmascarar esses cordeiros que se acreditam lobos. Porque, na realidade, são cordeiros é do capital.
Contudo, em sociedade, a generalização é sempre ilusória, aparente. Diferenças existem. Procuremos.
Vamos encontrá-las nos vereadores e vereadoras que, esquecendo o próprio umbigo, falam em nome de um coletivo ideológico. Iremos preferir, com certeza, aqueles que defendem a partilha igualitária da riqueza, , o crescimento social ecologicamente sustentável,  o protagonismo cidadão e a vida "acima de tudo". Estes serão a voz da consciência crítica, só ela capaz de mudar o mundo.
Maria

Uma leitura necessária: A democracia brasileira e a cultura política no RS, Marcello Baquero e Jussara Reis Prá. UFRGS Editora, 2007.



Nesta obra, os autores apresentam seus estudos sobre a cultura política do RS como uma contribuição ao entendimento das razões que garantem a permanência de práticas personalistas e arbitrárias na política contemporânea.


Uma leitura imprescindível: A Ideologia Alemã, Marx e Engels. Disponível em diversas edições contemporâneas, inclusive Pockets.



Um retorno a Marx e Engels não é certamente um regresso nostálgico ao passado. Sua "re-leitura" não nos afasta do presente. Trata-se de um diálogo que é daqui e de todos os lugares, de ontem e de hoje, e possivelmente ainda de amanhã, enquanto o reino planetário da mercadoria continuar a manchar de chumbo o nosso horizonte. Na Ideologia Alemã há o esboço de uma nova escrita da história, sem promessas, resultante de escolhas e decisões, da concretização de uma possibilidade entre outras.
Boa leitura!

2 comentários:

  1. gostei demais dos textos e indicações de livros. Esta constatação sobre a despolitização da política reflete a análise crítica de quem observa os caminhos que os partidos assumem, portanto, refletem nos seus representantes. Mas como citado, devemos procurar identificar as diferenças.

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  2. Através da história, transformam-se valores em costumes e costumes em tradição (ou diria dogma?).
    Andarilhando pelo tempo, se vê que a individualidade se transformou em individualismo e os "15 minutos de fama" se tornaram preciosidade moderna.
    O "eu" do aqui cada vez mais dissipa o "nós" do mundo.
    Quem sabe escritos como este teu auxiliem a busca do "nós", envenenando o costume do "eu" - antes que este costume vire tradição?

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